Embarcar na fantasia pode estimular a imaginação e a criatividade dos filhos, mas os pais não devem insistir na crença caso a criança descubra a verdade
O garoto Joaquim Dias Rubim, de 6 anos, ficou um pouco desconfiado quando, no ano passado, o Papai Noel chegou todo bronzeado para entregar os presentes de Natal. “Ele estava moreno. Acho que tinha ido à praia”, contou o menino, estranhando que um sujeito que mora no Pólo Norte aparecesse com a cor do verão. Mas com o incentivo da mãe, a pedagoga Simone Rubim, a suspeita foi esquecida e, neste ano, ele já fez a cartinha ao bom velhinho. “Eu acho importante ele acreditar, resgatar esta inocência, esta fantasia nas crianças”, diz Simone.
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A dúvida em crenças como a do Papai Noel é um processo natural no desenvolvimento infantil. Geralmente, por volta dos sete anos, quando o pensamento da criança é mais lógico e ela começa a comparar informações, a desconfiança aparece. No entanto, a idade da “descoberta” pode variar de acordo com o estímulo que ela recebe dos pais e com o ambiente em que vive.
Incentivar as crianças a crer em figuras imaginárias, como a do Papai Noel, enriquece o imaginário e favorece a exploração das ideias e do pensamento infantil, segundo explica a psicóloga e psicanalista Santuza Fernandes Silveira Cavalini, professora doutora da Universidade Mackenzie,em São Paulo.“O importante é entender que o mundo de fantasia é fundamental para que ela possa compreender a realidade. A fantasia, a brincadeira e a imaginação ajudam a criança a lidar com os seus sentimentos”, comenta.
O psiquiatra José Raimundo Lippi, especialista em crianças e adolescentes, diz que a crença no Papai Noel contribui, ainda, para o estímulo da criatividade e atende às fantasias de onipotência próprias da primeira infância. “Assim como creem que os super-heróis podem voar, elas acreditam na existência de um ser poderoso, que pode atender aos seus pedidos”, explica.
Meu filho descobriu, e agora?
Com crianças antenadas no mundo virtual fica cada vez mais difícil manter a fantasia por muito tempo. Segundo apsicopedagoga Maria Irene Maluf,hoje em dia é complicado queuma criança com acesso à internet, à TV, que vá à escola e que tenha irmãos e amigos mais velhos acredite na figura do Papai Noel após os cinco ou seis anos de idade.
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E, quando a dúvida surge, é comum que a criança procure respostas no computador ou questione os pais ou os familiares. A advogada Juliana Leal passou por isso quando, no ano passado, depois de comentários de coleguinhas da escola, o filho Vinícius Leal, então com 9 anos, veio perguntar sobre a existência do bom velhinho. “Respondi que, se dentro do coração dele ele acreditasse, então o Papai Noel sempre iria existir”, conta a mãe.
A resposta “em aberto” de Juliana foi proposital. “Não queria forçar uma situação, obrigá-lo a acreditar ou fazer com que ele fingisse acreditar no Papai Noel só para não me deixar chateada”, explicou.
Foi então que, a partir daquele ano, Vinícius deixou a fantasia de lado. Não escreveu a tradicional cartinha, como fazia antes, e pediu o presente de Natal diretamente à mãe. “O problema é que, hoje, as crianças convivem com o mundo real e outro virtual o tempo todo e estão muito mais aptas a compreender, por si mesmas, que o Papai Noel é um personagem muito mais cedo do que os adultos pensam”, explica Maria Irene Maluf.
A psicopedagoga recomenda também que, quando os pais forem questionados, o melhor mesmo é serem francos com a criança e não forçarem a crença. “Quanto mais tempo estes adultos insistirem na veracidade da história do Papai Noel perante um filho que já conhece a verdade, maiores a angústia e a decepção da criança. Afinal, insistindo nessa situação parece que os pais não acreditam que ela já tenha crescido a ponto de distinguir a fantasia da realidade”, diz.
Maria Irene faz questão de ressaltar que essa revelação deve ser feita ao tempo da criança. Ela explica que ser radical e dizer que a figura não existe, sem que a desconfiança tenha vindo da própria criança, é tirar dela a participação em uma história emotiva, cheia de símbolos e com um personagem que dá exemplo de bondade, ensina virtudes e dá esperanças, como outros tantos heróis.
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Antes da hora ou tarde demais
Mas o que fazer se a criança desconfia muito cedo que Papai Noel não existe? Neste caso, o melhor é voltar a pergunta, indagando o filho: “o que você acha?”. Assim, descobre-se exatamente o que ele já sabe e o que realmente deseja entender. “O melhor jeito é dizer que o Papai Noel existe, sim. Explique que ele é personagem de uma linda história, contada há muitos anos na época do Natal e, assim como a Cinderela e o Peter Pan, mora na nossa imaginação”, indica Maria Irene.
No entanto, também não há motivos para preocupação se a descoberta demorar mais a aparecer. “O que ocorre é que muitas crianças são desestimuladas e mesmo desencorajadas a persistir na crença por familiares ou coleguinhas. O fato é que cada uma precisa do seu tempo para deixar de acreditar no Papai Noel e em outras crenças”, conclui o psiquiatra José Raimundo Lippi.
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