Na Inglaterra, casa e ateliê para artistas em região portuária. Em Amsterdã, vila para estudantes. E no Brasil, um novo jeito, mais econômico e sustentável, de morar. Ainda são poucas as pessoas que investem na ideia, mas vem crescendo a procura por contêineres para serem usados como base para a construção de casas. Tanto que nos últimos dois anos, os preços dos contêineres reciclados simplesmente duplicaram: de R$ 3 mil para R$ 6 mil.
Sim, porque as grandes caixas são as mesmas que por dez, 15 anos transportaram de medicamentos a televisores, de roupas a carros, pelos mares, e, na hora da aposentadoria, encontram nova utilidade, ainda mais longa — especialistas estimam que as casas-contêineres podem durar até 90 anos.
A arquiteta Lívia Ferraro, de Florianópolis, começou a estudar o assunto na universidade. Seu primeiro projeto de casa-contêiner foi o de conclusão do curso, em 2009. Daí, descobriu o mercado e abriu uma empresa. Desde então, já construiu, com o sócio Lair Schweig, dez casas com os módulos, sem deixar de lado a inovação arquitetônica. Como a do terreno com vista para o mar, em Florianópolis, que ganhou fachadas de vidro e madeira de reflorestamento, além de deck de acesso preso por cabos de aço.
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“Nós já fizemos desde casas compactas, de dois contêineres, até residências de 250 metros quadrados. Costumamos dizer que é como brincar de lego. Só precisamos descobrir novas maneiras de ir encaixando as pecinhas”, diverte-se Lívia, informando ainda que hoje está trabalhando no projeto de uma casa de 200 metros quadrados dentro de um condomínio. “Uma barreira que está sendo vencida: uso de materiais alternativos em condomínios, até então restritos à alvenaria. Este projeto prova que os contêineres podem dar um caráter arrojado e de alto padrão à arquitetura.”
Outro arquiteto que tem se especializado no tema é o paulista Danilo Corbas. No ano passado, ele construiu sua própria casa utilizando quatro contêineres marítimos e resolveu abrir o espaço à visitação. Hoje, toca quatro novos projetos. Um deles, localizado em Penedo, Estado do Rio, vai contar com seis contêineres de 20 pés — cerca de 15 metros quadrados cada um:
“Uma das vantagens do material é que ele permite que a obra seja feita em etapas. Então, acaba viabilizando uma construção maior.”
Segundo Corbas, a economia na obra gira em torno de 35%, se comparada a uma construção tradicional. Grande parte dela na fundação da casa, que, no caso dos contêineres, exige intervenção bem menor. A questão do entulho também é importante. Em sua casa, de 196 metros quadrados, só foram retiradas duas caçambas de resíduos, o que, normalmente, passaria de cem. Além disso, quem assume a estética do contêiner, economiza em revestimento externo. O custo costuma ficar em torno de R$ 1.200, o metro quadrado. Mas quem são as pessoas que optam por morar em casas de aço?
“Normalmente, quem tem disposição de morar num lugar diferente é alinhado à questão da sustentabilidade, mas também quer economizar.”
É esse exatamente o caso de um de seus clientes: o diretor teatral Calé Miranda, da casa de Penedo. A ideia era construir uma moradia sustentável e, ao saber da possibilidade de usar contêineres, ele logo se interessou.
“No início, achei que poderia dar a sensação de confinamento. Mas os ambientes podem ser bem amplos. Além disso, era uma boa solução para o terreno, que é inclinado, e seria mais econômico”, conta Calé, que optou por cozinha e sala integradas, dois quartos e três terraços que ajudarão a ampliar os espaços.
Lojas e escritórios também vêm investindo no uso de contêineres – Além da economia na obra, a construção em que contêineres são a base é muito mais rápida: leva de 60 a 90 dias. E boa parte se dá fora do canteiro, já que os módulos podem ser transportados para o terreno quase prontos. Talvez por isso, venha crescendo o número de empresas interessadas em instalar suas sedes em ambientes do tipo.
Prova disso é a chegada da Tempohousing, empresa holandesa que criou uma vila de estudantes em contêineres em Amsterdã, em 2005, para três mil pessoas, e aporta no Brasil nos próximos meses para vender produtos, que incluem ainda escritórios e hotéis.
“Para as empresas, além da mobilidade e da economia, há ganhos em termos de imagem”, defende o arquiteto Danilo Corbas, que, além das casas, trabalha num projeto de agências bancárias em contêineres que seriam usadas para testar novas praças.
Algumas construtoras também têm encomendado contêineres para fazer estandes de vendas de seus lançamentos, já que eles podem ser reutilizados em novas obras, o que já garante alguma economia para as empresas. E há também lojas que estão escolhendo os módulos de aço como solução construtiva. A Decameron, que vende móveis em São Paulo, por exemplo, contratou os arquitetos Marcio Kogan e Mariana Simas, da MK 27, para tocar o projeto de seu novo espaço.
“O ambiente foi construído com uma solução mista com contêineres e uma estrutura metálica especificamente desenhada. Apesar da limitação espacial dos módulos, a peça tem impressionantes peculiaridades estruturais que possibilitam que sejam empilhadas”, diz Kogan.
Especializado em lojas e estandes para empresas, o grupo Container foi o criador do projeto da Container Ecology Store, loja multimarcas que surgiu há três anos na gaúcha Xangri-lá, e hoje já tem cem franquias em todo o país (uma delas aqui no Rio, na Barra). E a empresa começa agora a investir em hotelaria. Há dois hotéis em construção: um no interior de São Paulo, mais econômico, e outro em Recife. Nesse caso, um hotel design na praia de Boa Viagem. Em São Paulo, serão 120 quartos de 15 metros quadrados. E em Recife, 88 de 60 metros quadrados.
“Estamos conseguindo mostrar que o contêiner é viável e pode ser utilizado para diversos fins. Nosso início foi muito difícil, me chamaram de louco, mas conseguimos transformar a marca em negócio”, diz André Krai, sócio-fundador do grupo Container.
Nos Estados Unidos, prédio comercial de contêineres – Se, por aqui, o novo mercado ainda começa a se fortalecer, lá fora, construções desse tipo se tornam cada vez mais comuns. No estado americano de Rhode Island já existe até um prédio comercial feito somente com os módulos de aço. Projetado pelo Distill
Studio, o Box Office tem três andares e 12 salas, 75% delas alugadas em quatro meses.
“Projetamos o prédio para que economizasse 65% de energia, mas, depois de um ano, a economia chegou a 75%. Isso mostra que bom design e eficiência de energia podem andar lado a lado”, diz Joe Haskett, diretor do Distill Studio e arquiteto responsável pelo projeto.
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